" Acho que sempre quis ser pai.
Lembro que desde a minha adolescência já imaginava como seria ter um filho ou uma filha, e como eu me relacionaria com eles, como seria o exemplo pra eles.
Lembro também que sempre estava rodeado de crianças. Os filhos mais novos dos amigos dos meus pais sempre queriam brincar comigo, e por vezes os pais destas crianças brigavam com elas pra largarem do meu pé! Hahaha! Ou então quando acampava, os menores só podiam ir para os lugares "perigosos" quando eu estava junto.
Sempre gostei de crianças, então pra mim era natural ter um filho, que eu pudesse chamar de meu.
E então, esse dia chegou.
Depois de quase uma semana de menstruação atrasada, a Josi fez o teste de gravidez de farmácia. Positivo. E fez o exame de sangue no laboratório. Super positivo! Finalmente eu saberia o que é ser pai. O que é sentir o amor mais puro que existe no mundo (Esse já é um detalhe importante de se destacar, antes que eu seja criticado. Não estou menosprezando as outras formas de amar, mas pode perguntar para qualquer pai ou mãe na face da Terra, e a resposta será a mesma: o amor que a gente sente pelos filhos é maior que qualquer coisa, e só isso já enche o coração de qualquer pessoa pra querer sentir esse sentimento).
Foi uma gravidez super desejada, e apesar de não termos planejado a data exata para a concepção, estava nos nossos planos.
E então começaram os preparativos pra chegada desse novo ser, e também os questionamentos: será que eu vou ser um bom pai? Será que vou dar conta de manter uma casa (financeiramente falando)?
A questão financeira foi a mais discutida, justamente porque tínhamos acordado que a Josi ficaria em casa pra cuidar do bebê pelo tempo que ela quisesse, e só voltaria a trabalhar se a coisa apertasse, mas obviamente eu não queria que isso acontecesse. Sei por experiência própria da importância da figura da mãe na vida do seu filho nos primeiros anos de vida, pois a minha mãe abriu mão de trabalhar para cuidar de mim e da minha irmã, e sei que ela guarda com muito carinho este tempo que ela passou com a gente.
Enfim, este é um tema que a gente carrega até depois do nascimento dos filhos, mas sempre damos um jeito de contornar. E de superar. Passados estes primeiros dilemas, começaram os primeiros ultrassons. O primeiro, logo nas primeiras semanas, mal dava para ver se tinha alguma coisa; era um pontinho preto no meio do nada. Mas no seguinte deu pra ver melhor, o embrião se formando, virando feto, até que enfim chegou o dia de saber o sexo!
Eu dizia que no fundo não tinha preferência, mas no fundo, lá no fundo, queria uma menina. E na hora de saber se era menino ou menina... Pernas fechadas! E o cordão em volta da cintura pra dificultar ainda mais as médicas (sim, as médicas. Foram 3 pra tentar descobrir o sexo e nada!). Falaram pra gente voltar na semana seguinte pra tentar novamente. Muita conversa com a barriga durante os dias seguintes, até a próxima ultra, e para a nossa alegria, a Alice estava a caminho! Até então as conversas com a barriga se resumiam em falar com o "bebê", e agora tinham um nome específico. E assim foram todas as noites (ou 99% delas, pelo menos), passando óleo, conversando, vendo a barriga crescer, se mexer. Uma gestação super tranquila e gostosa (do meu ponto de vista, claro!).
Mas muito desta tranquilidade só foi possível por 2 pontos importantíssimos: a nossa preparação enquanto pais (livros, artigos, vídeos, encontros de recém mães e gestantes) e a presença de uma doula durante a gestação.
Aqui, merecem 2 pontos de destaque. Em primeiro lugar, eu de fato, não sabia muito qual a função de uma doula, conhecia o termo, e só. Mas depois que contratamos a Gabi (olha o merchan!), ela foi uma luz nas nossas vidas, pois tirava todas as dúvidas da Josi (principalmente as dela, eu quase não fazia perguntas). E nos preparou com várias informações importantes pro dia do parto, até pra não irmos antes da hora e a Josi acabar em uma cesárea desnecessária.
Em segundo lugar, e essa é exclusivamente aos homens e futuros pais que lêem estas linhas. Leiam tudo o que as suas parceiras compartilharem com vocês no Facebook, vejam vídeos de parto com elas, leiam as partes dos livros que elas acharem interessantes de vocês lerem. Não é pra puxar o saco da minha mulher nem pras mulheres de vocês ficarem: "Viu?! Ele lia! Olha o exemplo!". Mas pra dizer como isso foi fundamental pra minha preparação como pai, coisas que eu nem imaginava quando era adolescente e só tinha uma visão romântica da paternidade. Porque se a gente não se prepara, não sabe o que esperar de um parto, as fases, os gritos, a gente pira, surta, se afoba. E se isso acontece, as nossas parceiras piram junto; pra elas (ou para a maioria), nós somos o porto seguro, o ponto de referência que tudo está bem, e precisamos estar bem pra elas estarem bem.
Voltando à gestação. As semanas finais chegaram, e com elas as expectativas de como prosseguir com o parto. A maior preocupação da Josi era ter que ir pro hospital antes da hora e acabar em uma cesárea sem necessidade de tal; eu também tinha essa preocupação (mais por ela do que por mim, porque eu sabia que ela desejava um parto normal), mas me mantinha calmo e procurava acalmar ela também (lembram que eu falei da preparação?).
Mas aí tudo mudou naquela quarta feira, dia 1º de fevereiro. Eu não tinha dormido naquela noite, e estava me preparando pra sair pra fazer um exame admissional, quando a Josi levantou sentindo alguns pródromos (contrações de treinamento, normal pra 39 semanas de gestação), e resolveu tomar um banho. Quando ela voltou pro quarto e deitou, logo me chamou. Entrei no quarto, e levei um susto! Ela levantada do lado da cama, o chão todo molhado, assim como o lado dela da cama.
Ela olha pra mim e diz: "Acho que a bolsa rompeu...". "Tu acha?!", respondi num tom de brincadeira, mas no fundo tinha um mix de emoções passando pelo meu corpo! Peguei um toalha, entreguei pra ela e falei pra ela tomar banho enquanto limpava tudo. Pra resumir esta parte, ela dormiu enquanto eu fazia o exame admissional, caminhamos, almoçamos, jogamos videogame, eu dormi enquanto ela raspava a perna e fazia posições de yoga, fomos no mercado, comemos pizza, recebemos a visita da nossa doula e de uma enfermeira (Raquel, outro ser iluminado que tivemos o prazer em conhecer!) pra ver os batimentos cardíacos da Alice, e fomos dormir por volta da meia noite.
Dessa parte em diante, eu só sei a partir das 4:30 do dia 2. Antes disso, uma hora e meia pra ser mais exato, só o que a Josi conta, porque eu estava apagado no quarto ao lado. Só lembro de ser acordado por uma mulher nua aos berros na porta do quarto, falando silabicamente comigo, e visivelmente exausta. Era a Josi. E o trabalho de parto tinha começado enquanto eu dormia. Tava chegando a hora de conhecer a minha filha! Mas pera, temos que chegar no hospital antes disso! Mas a grávida tá no banheiro, embaixo do chuveiro! Tá, e as contrações, tão de quanto em quanto tempo? Calma, Caiko, respira!
Josi interrompe o silêncio: "Liga pra Gabi". E volta a berrar com as contrações.
Claro, a Gabi! Ela vai saber o que fazer. Liguei pra ela, enquanto tentava achar um ponto de início e fim das contrações, pra passar pra ela.
"Alô..."
"Oi. Gabi! É o Caiko. Olha... As contrações da Josi tão bem ritmadas, não tô conseguindo contar..."
"É, tô ouvindo... A gente se encontra no hospital, tá?"
"... Tá..."
FU-DEU, foi a primeira coisa que se passou na minha cabeça. Mas aí eu parei, e pensei: eu consigo, não deve ser tão difícil. Nisso a Josi me chama, pedindo a bola de Pilates. Quando cheguei no banheiro, a surpresa.
"Não entra no box."
"EMPURRA!!!"
Olha, não é que entrou? Hahaha! Óbvio que isso nunca saiu da minha boca, senão talvez não estaria contando isso pra vocês.
Brincadeiras à parte, saímos de casa às 5:00 e às 5:20 chegamos no Hospital Sto. Antônio. E uns 10 minutos depois estávamos dentro da sala de parto, com a Josi em pé ao lado da maca, com dilatação total, Alice já coroando, e eu vendo tudo aquilo acontecendo, apoiando a minha companheira de frente com ela, vendo a Alice nascer numa posição privilegiada! Foi um momento muito especial, podem ter certeza! Uma cena que vou guardar pra sempre na memória foi estar de mãos dadas com a Josi, e ver a cabeça da Alice sair, e dizer: "Vai, amor, tá quase! Já tô vendo ela!"
Umas 4 contrações depois, veio ao mundo a pessoa que mudou a minha vida, literalmente. Alice foi passada por debaixo da Josi, e eu ajudei a pegar ela nesse momento, mas como o cordão umbilical era muito curto, ele se rompeu. Na hora, todos os profissionais se assustaram, acharam que a Josi estava tendo uma hemorragia, e rapidamente fizeram todos os procedimentos, deitaram a Josi e me passaram a Alice. Foi tudo muito rápido e nós só soubemos disso depois. Na hora, foi um momento sem igual, lindo e muito emocionante.
Quando a Alice veio pros meus braços, o imprinting foi automático. Eu me sentia a pessoa mais feliz do mundo com aquele pedacinho de gente comigo. Parecia que o tempo tinha parado por alguns segundos, e eu pude presenciar o milagre da vida, a partir da minha própria existência.
Agora eu sabia o que era se tornar pai.
Quando a Josi me perguntou: "Como ela é?", me deu um nó na garganta, eu segurei o choro e disse, com a voz toda embargada: "Ela é linda!"
Não pensem que eu segurei o choro por vergonha, quem me conhece sabe que eu sou uma manteiga derretida. Eu não soltei o choro porque eu sabia que eu não ia conseguir parar de chorar tão cedo. Talvez nós receberíamos alta do hospital e eu ainda estaria chorando, hahaha!
Daquele momento em diante, ela não saiu dos meus braços ou da minha vista, até ela poder ir para os braços da Josi. Lembro de um momento, já no leito, que a Josi foi no banheiro, e quando ela voltou, a Alice ainda estava nos meus braços, e ela disse: "pode deixar ela ali no berço.", e eu de pronto respondi: "Eu esperei 9 meses pra ter ela nos meus braços, assim tá ótimo!"
Romantismos a parte, é a partir dessa hora que começa o dilema de ser pai. Porque não é só dos momentos tranquilos de sono, das poses pra foto, dos sorrisos de ternura que a gente vive. Agora tem cocô de madrugada, noites mal dormidas por conta de um desconforto intestinal, roupa vomitada/cagada pra trocar, ou simplesmente passeios intermináveis pela casa, caindo de sono, com o teu bebê a tiracolo, também morrendo de sono, mas sem vontade nenhuma de dormir. Sim, ser pai/mãe é cansativo... Os bebês são seres totalmente dependente dos seus progenitores, pra tudo, literalmente. Porém, quando a gente participa ativamente da criação dos filhos, a balança fica mais equilibrada. Eu fiz questão de trocar as primeiras fraldas (e ainda troco), dou banho, visto roupa, coloco pra dormir (às vezes a Alice só dorme no meu colo, inclusive).
É cansativo, e é frustrante, justamente porque os bebês quase nunca compartilham dos mesmos horários e dos mesmos desejos que os pais. Mas mesmo sendo assim, a gente faz com prazer, pois sabe que está criando um vínculo eterno, uma marca invisível que vai durar a vida toda. E não há presente que compre esse vínculo depois que os bebês crescem, a não ser o estar presente em si.
Na verdade, penso que estes nem são os desafios em si, pois já vêm no pacote quando nasce um bebê. Os verdadeiros desafios (na minha opinião) são com os pitacos alheios, de pessoas que insistem serem melhores pais e mães do que você e a sua companheira (e que às vezes nem tem filhos!). Porque já criaram 3, 4, 5, 2.582 crianças, sabem tudo sobre criação, e é bobagem não querer dar açúcar, ou é absurdo uma menina não ter orelha furada, ou usar roupas de cor de menino, ou ainda mais absurdo fazer cama compartilhada. Haja paciência pra essas pessoas, viu?
Ah, tem também aqueles sem noção que passam por ti pela rua, ou então dentro do elevador, e simplesmente PEGAM NA MÃO do teu bebê pra querer interagir! Gente, TÁ ERRADO, NÃO PODE! Em situações normais, as únicas pessoas que podem pegar na mão ou beijar os bebês são os seu próprios pais. No nosso caso, é um pouquinho ainda mais complicado...
Alice tem APLV (Alergia à Proteína do Leite de Vaca). Calma, a Alice não bebe leite de vaca, deixa eu explicar... A APLV é uma alergia alimentar, e no nosso caso, se manifesta na Alice em forma de cólicas e diarreia, através do leite materno, caso a minha esposa coma ou beba algo que tenha leite, derivados, ou traços de leite, e também através do contato pele a pele com a Alice. Sim, contato. A pele dos bebês é mais fina que a nossa, e absorve muito mais fácil o que entra em contato com ela. Ou seja, nada de pegar na mão ou beijar, EM HIPÓTESE ALGUMA. APLV tem cura, mas é preciso seguir à risca as orientações do médico, não é frescura nossa nem invenção pra que não peguem ela.
Hoje, 6 meses depois que a Alice nasceu, a vida parece ter outro sentido. A sensação é que tudo o que eu vivi antes desse momento foi um breve instante pra vida que estava por vir, uma preparação para a vida de agora em diante. Os acontecimentos que vieram antes, por mais felizes, importantes e grandiosos que foram, parecem pedaços de um sonho, que vamos lembrando ao longo do dia. E isso é um pensamento muito louco, mas real, porque eu não consigo mais imaginar a minha vida daqui pra frente sem ela...
Ser pai é uma aventura muito louca. Tem os dias de luta, e os dias de glória. Os dias de lágrimas de dor, e os de lágrimas de amor. É aprender a colocar outra pessoa na tua frente na lista de prioridades, sempre, e lidar com isso com amor no coração. É trocar fralda de cocô às 7h da manhã de domingo com um sorriso no rosto, só pra ter o sorriso correspondido. É acordar de vez em quando, pra ver se o teu bebê tá respirando, e às vezes dormir menos só pra contemplar aquele anjo na tua cama. É ser eternamente grato pela sua companheira por ter te dado o melhor presente do mundo.
Ser pai (e mãe) é uma missão de vida.
E é a melhor coisa do mundo!"
Caiko Miranda dos Santos
Publicado em: Desmistificando Mitos da Vida Materna
08/08/2017